sábado, 16 de junho de 2012

LUIZ DELFINO (1834-1910)


Luiz Delfino dos Santos nasceu em Desterro, hoje Florianópolis e lá concluiu, em 1857, curso na Academia Imperial de Medicina, no Rio de Janeiro; ao longo da vida, dedicou-se à medicina e à literatura. Já havia feito sua estréia literária, em 1852, com a publicação do conto O Órfão do Templo, na revista carioca Beija-Flor. Em 1859 tornou-se membro da Academia Filosófica, associação literária que reunia acadêmicos de Medicina e médicos. Entre 1861 e 1881 colaborou nos periódicos: Revista Popular, Diário de Rio de Janeiro, A Estação e Gazetinha. O poema mais famoso de sua primeira fase poética, A Filha d´África, foi publicado em 1862, na Revista Popular. Em 1885, foi eleito o maior poeta vivo do Brasil, em concurso da revista A Semana. Foi colaborador, em 1886, da revista A Vida Moderna, e entre 1898 e 1904, dos periódicos simbolistas Vera-Cruz, A Meridional, Revista Contemporânea e Rosa-Cruz. Elegeu-se senador da República por Santa Catarina, em 1890, no Rio de Janeiro. Em 1898, foi coroado Príncipe dos Poetas Brasileiros nos festejos comemorativos do primeiro aniversário da revista simbolista Vera-Cruz. Seus livros de poesia só foram editados postumamente; entre eles estão Algas e Musgos (1927), Íntimas e Aspásias (1935) e Imortalidades (1941). Os poemas de Luiz Delfino, segundo o crítico Péricles Eugênio da Silva Ramos, "ostentam caráter parnasiano, mas de um parnasianismo algo diverso do praticado pelos maiorais da corrente em nosso meio: é, com efeito, plástico e sonoro, por vezes até com complicações sinestésicas que poderiam dar-lhe laivos simbolistas.". 





CADÁVER DE VIRGEM


Estava no caixão como num leito,
palidamente fria e adormecida;
as mãos cruzadas sobre o casto peito,
e em cada olhar sem luz um Sol sem vida.

Pés atados com fita em nó perfeito,
de roupas alvas de cetim vestida;
o tronco duro, rígido, direito,
a face calma, lânguida, dorida...

O diadema das virgens sobre a testa,
níveo lírio entre as mãos, toda enfeitada,
mas como noiva, que cansou na festa.

Por seis cavalos brancos arrancada...
onde irás tu passar a longa sesta
na mole cama, em que te vi deitada?!...


***



A PRIMEIRA LÁGRIMA


Quando a primeira lágrima caindo,
pisou a face da mulher primeira,
o rosto dela assim ficou tão lindo
e Adão beijou-a de uma tal maneira,

que anjos e Tronos pelo espaço infindo
qual rompe a catadupa prisioneira,
as seis asas de azul e d'ouro abrindo,
fugiram numa esplêndida carreira.

Alguns, pousando à próxima montanha,
queriam ver de perto os condenados
da dor fazendo uma alegria estranha.

E ante o rumor dos ósculos dobrados,
todos queriam punição tamanha,
ansiosos, mudos, trêmulos, Pasmados...


***



A SAÍDA


O galo canta: o ar, que freme, é quente:
desce ruflando pelo vale o vento;
há no horizonte os rolos de uma enchente
do mar, que invade e doira o firmamento.

Toca a sineta; vem saindo a gente
da senzala, num jorro sonolento:
depois da reza, a passo tardo e lento,
enxada ao ombro, dois a dois em frente,

Ao eito vão pelo carreiro aberto:
o mato cheira, rumorejam ninhos
no cafezal, de branca flor coberto...

Há um grande chilrar de passarinhos...
e enquanto o escravo vai... segue-o de perto
a risada da luz pelos caminhos...

 


 

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