segunda-feira, 18 de novembro de 2013

FELIPE GARCIA DE MEDEIROS (1989 - )



 
Nasceu em Imperatriz, no Maranhão. Formado em Letras – Português e Literaturas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte mestrando na mesma instituição (2012). É autor do livro Frio Forte (Multifoco, 2012).




POEMA

recolho as palavras
e, fatalmente,
rogo em silêncio
pelo verbo
que será a porta
de onde
sairei
e tu me habitarás

***

A Rosa Glacial


A
flor
glacial

derrete
sobre o país

o percussor sombrio

são as sete
pragas do Egito
os sete pecados capitais

a voz do infinito
sagaz,
os
prados de concreto, a paz,
o olho secreto de Hórus,

- a flor fervilha
pelos poros
e a multidão brilha

como o outono deita a névoa
sob suas folhas
e a primavera
rompe
os
botões no espaço

da garganta dos jovens o sopro

corre nos pulmões
embaralha
cadeias
e destrói
em chamas os corações
de palha

na mesa, jogamos cartas e poemas

elevando os grãos e os galhos
às veredas das cinzas
e da ressurreição

urram, tentam impedir,
dão pimenta para Adão –
dão
vinagre para Cristo
crucificam,
bebem, riem nas estripulias,
e o raio cai dos céus
e o nosso
reino
se eleva à Deus

na variedade do milagre, saímos da hipótese

ninguém vê senão grito

“o parâmetro do desamparo
é o agito”

ninguém vê senão atrito
estamos aqui, amigo,
segue
o
rito.

Foucault finge
libelos
no gabinete
infinito
da
sua escrita
e o
esquete
de Maiakóvski
agita
o burguês
na rua

o povo mira os olhos contra o sol

e nos esquecemos de abandonar o corpo
para, no dia
através da noite
surgirmos, anônimos,
como
a brisa de outubro
e atingir
o tamanho

dos demônios da desolação.

Os tempos são frios
e as horas
obtusas
como o templo do sol

é por isso que cada um se levanta do poente
e borra as paredes, os prédios,
os trens,
os ônibus, as luas,

ninguém aqui está contente

as formigas
se aglomeram nas curvas, mirmidões,
não são peixes,
insetos,
bichos –

(o homem só descansa quando vive
ou após)

são homens que se empilham na cidade
um a um
somos
nós

a perna que se estica no universo
do panteão das estrelas,
para abrir-se
junto
ao líquido cálido
destes tempos,
desta fúria,
dessa flor que se desfaz no ócio das esferas

e gira sobre as sequelas,

doce dínamo dessa candura!


***



Canto-Navalha


Rasga-mortalha,
ouço-a
e não consigo escrever um verso
sobre o seu canto-navalha.

Estridula, pia, pragueja, urra –
não preciso
a
melodia, os raios da sua ranhura.

“Não perdeu a poesia”
o poeta me diz
e eu sei
um notebook é um notebook
e uma paisagem plana
faz girar o fluxo
do
território,

o canto da Rasga-mortalha me estranha

não tenho mais que relatos da sua fatalidade.

Um dia dois – talvez mais,
não existe poema em mim,
explicável?
“Tanto faz”
ninguém sabe
vejo filmes ou leio alguma coisa
é difícil
imaginar um poeta sem uma carta na manga

(ou um mágico sem truques,
as morenas/as rimas/o batuque).

Comprei o Robert Burns
e só encontrei canções
do meio dia
com
árvores e cotovias
e, no mais,
um estribilho

“ah, que tempos passados,
amigos, os que se passam”.

No desastroso silêncio do açoite,
enceno atritos
no
escuro
(corre no ar
infinitos
pios
vorazes nos vales da noite)

estrelas caem
e a Rasga-mortalha me desfigura em gritos.



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